A 26 de julho foi o Dia dos Avós. Senti ter os netos longe, mas fazer o quê? Na vida nem tudo sai como se quer. Todo avó ou avô é babão. Para eles, os netos são sempre lindos. E, se pequeninos, a gente faz o que pode para agradá-los, não é? Mousse pra uns, chocolate pra outros, quibe... Somos também “professores” deles; sempre que sobra tempo, ensinamo-lhes velhas brincadeiras, como castelo de cartas, jogo das varetas, amarelinha, caracol e muito mais. Guardamos bilhetinhos dos pequetitos, sua letrinha na programação do teatro improvisado na sala da avó, com direito a ingresso e cardápio do lanche, preço e tudo. Em meio à papelada, aulinha para alunos imaginários, provinhas com correção e nota, desenho da avó no fogão... E como nos surpreendemos com as espichadas, quando aparecem para nos visitar! _ Já passei a senhora, vó! – diz a neta, olhar vivo, ombro a ombro comigo. O vovozado é uma delícia inexplicável. Só quem tem o privilégio de ser avó ou avô entende o deslumbre daqueles que têm netos. Engraçado que a condição de ter netos está ligada à velhice. Mesmo que o mundo tenha mudado tanto, certas reações não mudaram. _ Ah, mãe, sou muito novo pra ser avô _ ouvi do meu “menino” grisalho. Logo ele será avô em dose dupla – um casalzinho. _ Novo? Já é cinquentão, filho... Idade de ser vovô, sim! _ retruco, imaginando os gêmeos que, em breve, me tornarão bisa. Mas o meu eterno menino ainda parece não acreditar. Creio que só encarará sua nova condição de pai duas vezes, quando estiver frente à frente com os bebezinhos. Então a ideia de velho ficará esquecida. O vovô skatista já estará pensando que, logo, ensinará os pequenos a fazer piruetas, descer ladeiras e muito mais.Alguém duvida?
minesprado@gmail.com “Rabiscos de Minês”: minesprado.blogspot.com.br Publicado no site do Extra News set 17
domingo, 10 de setembro de 2017
segunda-feira, 3 de julho de 2017
Vovô Octávio
Vovô Octávio
Meu avô materno foi marcante. De fato, era o patriarca. Sua opinião, sua concordância tácita ou explícita, tudo o que manifestava tinha peso razoável.
Seu nome? Octávio. E por ser tão importante para a família, seu nome se multiplicou nos descendentes: Octávio Fº, Ary Octávio, João Octávio, Luiz Octávio e Octávio, o bisneto.
Festas tradicionais tinham endereço certo: casa do vô Octávio. À mesa não faltariam o vinho tinto para os adultos e a sangria para a meninada. Interessante que nenhum dos miúdos exagerava na sangria... Tampouco considero que essa delícia tenha estimulado o alcoolismo.
Vô Octávio não era de muitos discursos, mas, como ótimo observador, deixou algumas falas memoráveis. Seria muito gostoso se cada membro da família enorme se preocupasse em transformá-las numa coletânea... Isso já não é para mim... Pena.
Mas guardo bem no fundo do meu core, uma frase por ele repetida sempre que nos cruzávamos:
_ Ah, como gosto desta sua testa limpinha! _ exclamava ele, enquanto alisava-me a fronte bem à mostra, os cabelos presos num farto rabo-de-cavalo ou num coque-banana.
Jamais percebi tal gesto de vovô com outras netas. Somente estas para contar, porém é tarde, muitas já partiram.
Hoje, como adulta, interpreto o gesto de vovô como comparação da minha testa com a de vovó que, ao contrário de mim, usava um penteado encobrindo parte da fronte com “pastinhas”, espécie de semicaracóis caprichosamente fixados com grampos escondidos. Não sei que nomes teriam agora as “pastinhas” de vovó.
Concluo que vovô não aprovava o penteado de vovó, porém respeitava o gosto dela. Amavam-se demais aqueles dois, tanto que faleceram num intervalo de poucos dias.
Vejo-os ainda sentados lado a lado, de mãos dadas, nos finais de tarde, no vasto alpendre da casa, hoje uma instituição católica, ao lado da capela de Santa Edwiges.
minesprado@gmail.com
Blogspot: “Rabiscos de Inês”:minesprado.blogspot.com.br
3-7-17
domingo, 25 de junho de 2017
Dança das Velas
III Dança das velas
Salão do Recreativo repleto. Ritmos variados sustentavam a animação. Todo mundo bem trajado, nada de jeans, tênis, calças agarradas... A elegância predominava.
Depois da valsa da meia-noite, um intervalo. Então velas numeradas eram oferecidas aos cavalheiros. O preço era simbólico: um cruzado ou real, não lembro.
Acabada a venda das velas, a orquestra retornava ao palco. Aos primeiros acordes de mais uma seleção, cavalheiros com vela na mão escolhiam suas damas. Às vezes, uns já haviam dado sinal àquelas com quem pretendiam dançar.
Alguma confusão acontecia nessa hora. Pessoalmente, diverti-me numa ocasião em que me apareceram duas velas... Só que eu já sabia que seria tirada por um dos cavalheiros. Pouco antes havíamos trocado olhares... Então declinei da outra vela, disse ao cidadão que dançasse com uma senhora amiga, idade bem avançada... Recebi um “não” do rejeitado, que saiu bufando e se mandou para longe. Se ficou segurando a vela, jogou-a longe ou tirou outra dama jamais soube.
A orquestra iniciava pra valer a seleção. As velas numeradas eram acesas e seguras pelos pares que rodopiavam pelo salão lindo, mágico. De repente a música era interrompida e alguém ditava um número. O par com o número ditado deveria sair da pista, mas sempre havia os ouvidos de mercador... Se a dança estava boa, apagava-se a vela, buscava-se um canto do salão fora das vistas de quem fiscalizava a brincadeira, ou melhor, havia os desobedientes... Até que alguém lhes batia nas costas para, decididamente, pararem a dança. Meio a contragosto a gente pedia desculpas e obedecia. Regras são regras, fazer o quê?
A brincadeira romântica só acabava quando havia um único par dançante, a quem cabia uma prenda. Essa delícia precisa ser resgatada, não?
Miap
25/6/ 17
sexta-feira, 23 de junho de 2017
Dança das Vassouras
Dança das Vassouras
A orquestra inicia o arrasta-pé. Pares animados, alguns enamorados, saem dançando. Seleções deliciosas como jamais se apreciaria anos depois. Ritmos variados e, o melhor, bem dançados. Nada de dois pra lá, dois pra cá, como se observa hoje.
Chega a hora da dança especial, aquela que rende um dinheirinho a mais no cofre do Country Club, em Poços de Caldas. Aliás, o que foi feito dos bailes de lá? Simplesmente sobrevivem no balaio das recordações.
Um sambão invade o ambiente. Logo a pista fica lotada de pés de valsa e de vassouras... E como vassoura não dança sozinha, cavalheiros desacompanhados dançam com elas. Só que sob certas condições: dançar um segundinho com a dama “esfiapada” e passá-la adiante, roubando a dama de um bailarino qualquer. Caso não o faça logo e a música seja interrompida, o cidadão lerdo é multado... Como ninguém quer pôr a mão no bolso, vassouras voam pelo salão. Os homens com vassoura não miram a dama bonita, boa dançarina ou a paquera, querem é se livrar da vassoura, para não sofrerem penalidade. Ao fim da seleção, os que sobram com a vassoura na mão ainda têm que dançar o frevo...
Ah, tempos divertidos esses... Bem que brincadeiras tão singulares poderiam ser resgatadas. O mundo deveria proibir a mesmice.
Miap 23 de junho de 17
sábado, 1 de abril de 2017
Self-Service
O passeio do fio
No self-service vê-se de tudo. Entra-sai, trombadas nas filas, fura-fila, gentilezas, como a oferta de lugar sobrando na mesa de alguém solitário...
Porém, o mais divertido é observar a montagem dos pratos – pula-se um, para-se noutro, pega-se um pedação de algo, larga-se, um menor é mais educado, a fila segue, a gente meio incomodada com a espera de quem está atrás.
Equilibra-se o prato feito e, ufa!, chega-se à mesa. E o desfile do entra-sai continua. Agora, sentada, a gente observa os detalhes nem sempre elegantes.
Passa um gordalhão, prato à altura da barriga, um fiozão caindo do prato, balançando tranquilo. Um amigo que espera o gordo, pega o fio e o joga no devido lugar: dentro do prato.
O gordo nem percebe o lance. Refestela-se na cadeira e manda ver. Pronto. O macarrão desce gostoso goela abaixo...
Self-service: sirva-se e... divirta-se à vontade. Se render “rabiscos”, a gente ainda sai no lucro.
Miap
1º/4/17
quinta-feira, 30 de março de 2017
No restaurante: ops!
Pizzaria. Mãe e filho num reencontro memorável. A saudade é muita. Assuntos mil, silêncio entrecortando recordações jamais perdidas no tempo.
Pedido: pizza meio a meio, cervejinha preta, refrigerante (guaraná x Coca, estranha dobradinha). Pra mãe, tanto faz, importa é o momento único ansiosamente esperado.
No papo sai de tudo. Artes da infância lá trás. O filhote de morcego cuidado como passarinho e levado à escola às escondidas... “Não se lembra, mãe?” Mãe, essa palavra nunca soou tão doce. Do morcego e da preocupação com a transmissão da raiva a mãe lembra muito bem. Do lance da escola, não.
E logo desenterram a santista Zi Teresa, cantina de vida longa, famosa, que cerrou as portas neste século. Quantos lances a reviver dali! Um deles – sem que os pais vissem, o filho caçula bebeu uma golada de chope, passou mal, se melecou todo, foi levado pra casa, para ser trocado. O nhoque, prato predileto aos domingos, ficou esquecido à mesa, até que o menino, carinha inocente, retornou com o pai. Almoço inesquecível esse!
As horas voam. É preciso aterrissar no aqui e agora. Sobra da pizza arrumada para viagem, conta paga. “Olhe aí seus óculos, o celular (mãe é mãe até debaixo d’água!).” Levantam-se, conferem a mesa. Bengala a postos. Vão saindo: a mãe, o filho amado, com tudo nos bolsos, mas, ops! , com o copo de guaraná x Coca na mão...
É, o rebuliço provocado por recuerdos deixa qualquer cuca fora do ar. Mistureba de emoções e ato falho são amigos íntimos, concordam?
MIAP
30/3/17
quarta-feira, 8 de março de 2017
Obrigada, gari
Obrigada, gari
Dia Internacional da Mulher. Mil ideias na cuca, pouca vontade de pôr alguma em prática. Indolente, faço um telefonema postergado há dias. Depois outro que me seria muito prazeroso. Nada de resposta. Então continuo no silêncio, só quebrado pelo rádio, companheiro fiel desde sempre.
Manhã de sol inclemente. A ordem é tomá-lo. Olha a vitamina D, hein! Pego o jornal, único empurrão para encarar a varanda com verdes que me encantam: renda portuguesa linda, hibisco exuberante, antúrio com folhas novas, flor de maio sinalizando as maravilhas que vêm por aí logo mais.
Folheio o jornal. Pulo tudo quanto é tema político, exceto um – a tornozeleira eletrônica de um dos presos da Lava Jato anda pintando o sete, fica sem bateria por horas. O preso é acusado de omisso, já que se compromete a carregá-la diariamente.
Leio aqui e ali sobre o nosso dia/todo dia. E mais a morte estúpida do menino de 13 anos cheio de sonhos que vivia a pedir nos semáforos.
Hora da coleta do lixo. O menino estampado no jornal, só que um pouco mais velho, personificado de gari, me interrompe:
_ Oi, tia, pode me arrumar um pouco de água gelada?
Converso com minha bengala: “Podemos?” Rapidinho ela me responde: “Se estamos pelando aqui, imagina esse coitado!”
_ Sim, posso, moço. Só que vai demorar um pouquinho. E aponto a bengala.
_ Não faz mal, tia. Eu espero.
Com vagar, chego à geladeira, pego a garrafa descartável geladíssima, volto à varanda caliente. Terá ido embora o gari? Não, está à espera da água, sentado à sombra do meu flamboyant. Vendo-me, levanta-se rápido, pega a garrafa:
_ Tia, muito obrigado! Deus a abençoe. E desculpe por interromper sua leitura!
Que muitas bênçãos caiam sobre esse menino gari. Que seus sonhos se realizem. Obrigada a ele por me dar a oportunidade de lembrar que o mundo não gira somente em torno de nós e nossas mazelas. Que milhares de meninos anônimos são os verdadeiros heróis deste mundinho onde a disputa por uma condição social decente é brava.
Miap
Março/17
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017
Renda Portuguesa
Renda portuguesa
A minha é dos anos 60, presente de casamento de uma vizinha muito querida, dona Maria. Claro que já virou várias gerações e sempre floresce bela, após a poda que se faz no fim de julho. Tenho um xodó absurdo por essa maravilha delicada e de um verde exuberante, que vem alegrando meu viver desde Santos, sendo parte obrigatória das tantas mudanças que fiz.
Admiro-a todo santo dia. Por isso, qualquer alteração no visual dela me preocupa.
Indo direto ao assunto – as benditas lagartas que têm nela seu cardápio predileto. São aquelas lagartas bem pequeninas, dois centímetros talvez, que liquidam com a renda num piscar de olhos. O dia em que o piso onde ela está aparece cheio de picotes verdinhos, já se sabe – invasão de lagartas. Isso acontece esteja ela onde estiver, seja pendurada na cozinha, dando aquele toque divino da natureza, seja num vaso convencional, enfeitando a varanda.
Que me recorde, em tantas décadas, poucas vezes elas fizeram a minha renda de banquete. Uma vez, da noite para o dia, o piso da cozinha da casa “velha” amanheceu forrado de verde, abaixo da renda pelada, pois só sobraram os galhos. Fiquei boquiaberta, era minha primeira experiência com as danadinhas!
Agora acontece de novo, só que à prestação. Ontem, tive o alerta – havia picotes junto ao vaso no chão da varanda. Pus os óculos e esmiucei ramo por ramo da renda. Descobri só uma lagarta. Não titubeei, quebrei o galho onde ela estava e enfiei-o num saco plástico que vem com o jornal. Ali ela ainda teria um bom tanto de banquete, embora com certo remorso. Afinal, é um princípio de vida que sufoquei.
Hoje cedo, fui direto visitar a renda, na verdade não minha, mas da natureza. Mais picotes pelo chão! Pus-me a vasculhar os ramos, achei três vidinhas a pastar no vaso. Não tive duvida, esqueci o remorso, enchi outro saco com banquete e penetras. Mas veio a culpa pra valer.
Liguei para um amante de plantas, pedi orientação. Que vexame! Do outro lado do fio, veio uma aula de botânica: as coitadinhas passavam pelo processo de se tornarem belas borboletas. “Mas essas lagartas tão pequeninas?” – indaguei. Sim, sim, eu deveria só apreciar de camarote a destruição da minha renda. Logo, logo ela se desenvolveria mais exuberante outra vez. E mais borboletas coloririam a vida...
Senti-me como partícipe de abortos. Deixo aqui um mea culpa cavalar.
minesprado@gmail.com
Fev/17
Assinar:
Postagens (Atom)