quinta-feira, 26 de maio de 2016

A mobília nova

A mobília nova No dia D, 12/5/16, quando se votou a continuidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff e, por consequência, seu afastamento por 180 dias, uma amiga indagou-me no FB: “Você não teria que retratar Brasília hoje?” Pra ser sincera, nem me recordo se lhe respondi ou postei tão somente uma carinha marota, um dos tais stickers que a rede virtual oferece, encolhendo cada vez mais nossa criatividade. Pois creio que, por eu não atender à sugestão dela, essa amiga decidiu vingar-se, invadindo meu sono madrugada adentro. De repente, eu e mais um monte de gente estávamos à espera da própria, na casa dela. Tudo porque ela logo chegaria com sua mobília nova. Reunião estranha essa! Postei-me bem perto da entrada da sala, de tal modo que seria a primeira a cumprimentá-la pela aquisição da mobília e aproveitaria para avisá-la de que não queria ouvir falar de Brasília. Eis que ela chega, toda soberba, mal olha para os lados, vai direto a um espelho centenário e, estática, escancara a mobília novinha, branca demais pro meu gosto. (Era o próprio Narciso fascinado diante do lago...) Ridícula! Depois gargalha, abraça uma sujeita de cabelos curtos, talvez mui amiga dela, e... buá!! _ Mãeeee, quero colo! Será que a mobília nova havia enlouquecido a coitada? Coitada, não. Afinal, ela, que adora quebrar protocolo, havia bagunçado o clima de expectativa, ao cair naquele choro absolutamente teatral É provável que estivesse rindo por dentro. Na sala, todo mundo se entreolhou, sem entender nada, muito menos eu, que nunca pisara na casa dela nem sabia que estava a trocar de mobília... Essa situação maluca me despertou às quatro da matina. Cansada de revirar-me na cama, acendi o abajur. O sono já era. Seria por culpa da amiga, com sua alusão à Brasília, assunto que esgotou minha paciência faz tempo, e mais aquele exibicionismo do sorriso-Omo? Talvez não fosse nada disso, mas sim porque Brasília e mobília dão boas rimas. E, ultimamente, ataques de rima têm baixado em mim sem mais nem menos, só que, agora, até em sonhos é demais. Insone, saquei um bloquinho do criado-mudo e rabisquei até o dia raiar. De qualquer modo, espero que, quando nos cruzarmos nas ruas desta terrinha, minha amiga não me venha contar que, trocou mesmo a “mobília”. Porque aí, incontinenti, mudo de profissão: serei Minês, a vidente... minesprado@gmail.com “Rabiscos de Minês”:minesprado.blogspot.com.br Maio/16

quarta-feira, 11 de maio de 2016

As cãs de mamãe (Extra News - abril/16)

As cãs de mamãe Nesta semana criei coragem para rever um monte de fotos da família, para logo iniciar a distribuição entre os filhos. Assim, menos sarilho, quando eu partir. Só que não preveni minha emoção. E agora o inevitável acontece: cada foto sacode a poeira do passado.Algumas lágrimas correm e me fazem entender que essa partilha antecipada custa tremenda saudade. De chofre, dou com mamãe ao lado de papai quase moribundo. Que lindinha ela era, da cabeça aos pés. Ela e a preocupação com os cabelos alinhados. De toda a mulherada da família, minha mãe foi a única que preservou a cabeleira da química danosa. Durante mais de sete décadas, seus cabelos eram negros, de comprimento médio. Quando os primeiros branquinhos despontaram, chegaram a incomodá-la: _Parece cabeça suja – ela dizia. Mas, acabou se habituando, deixou de se queixar. Mamãe era vaidosa, mas evitava salão de beleza. Idem acontece comigo. Ela mesma cuidava das madeixas jeitosas, nem lisas nem crespas. Para sorte dela, que odiava cabelos escorridos. Por isso mesmo, encrespava os desta rabiscadora, com permanente, feita de um liquido fedido com que se embebiam os papelotes (mechas de cabelo embrulhadas em papel de seda). Eu, tímida, nunca ousei dizer que abominava cabelos artificialmente encrespados. Ela somente soube disso quando eu já era burra velha. Coitadinha, eu não lhe deveria ter feito tal confissão. Os anos voaram. Como na vida tudo é cíclico, chegou o momento de papai me pedir para cuidar dos cabelos da sua querida Edy. Ele sabia que eu dava uma de cabeleireira, cortava o cabelo dos meus meninos, quando não podia pagar barbeiro. Aliás, eu, já adulta, cortava até os meus... Quanto malabarismo se faz nesta vida! Vejo papai a me pedir: _ A hora que você puder e sua mãe estiver disposta, dá para cortar o cabelo dela? Só que, por favor, não deixe a nuca de fora nem as orelhas. Eu o atendia sempre, sem indagar o porquê da recomendação. Era o gosto do Dan e dela também, pronto! Respeitar o modo de ser deles era o mínimo que eu, filha, poderia fazer. Afinal, difícil esperar que estranhos se preocupassem com as preferências dos meus queridos. Quando se é muito sensível, decora-se o perfil dos pais e se faz de tudo para vê-los felizes. Lamento as tantas vezes que, por razões íntimas, eu os tenha contrariado. Eu conseguia manter o corte do cabelo de mamãe arredondadinho, meio repicado nas laterais. Achava linda aquela cabecinha que foi se acinzentando lentamente. Então, ela se mantinha imóvel tal criança comportada. Eu evitava que as aparas a incomodassem. Então, punha num saquinho cada pouco cortado. Papai faleceu em 1998; mamãe, em 2009, aos 96 a. Por motivos alheios à minha vontade, nos últimos tempos dela, deixei de lhe fazer este pequeno mimo: cuidar de sua cabeça cinza. Então, sofri muito, pois certos profissionais mal orientados, embora carinhosos, deixavam-lhe nuca e orelhas aparentes. Pedia a Deus para que o cabelo dela crescesse logo e para que seu querido Dan, em morada distante, não tivesse nenhum dissabor. Se fosse só eu a sofrer, paciência, mas eu sabia que mamãe, ao se mirar no espelho, também ficava desgostosa. Isso me doía demais. Assim como me doía vê-la aflita com vento inoportuno a descabelá-la. Ela, uma santista, tinha pavor do ventinho da praia, não só porque sofria de enxaqueca, mas porque não tolerava cabelos desalinhados. Nem nela nem nos outros... _ Mãe querida, ainda sinto o perfume de suas cãs virgens... Agora, só na saudade. Maio/16 minesprado@gmail.com “Rabiscos de Minês”:minesprado.blogspot.com.br. Maio / 16.

Interrogação (Extra News - abril/16

Excepcionalmente, trato de assunto política e economia, mas já aviso: a contragosto. O Brasil atravessa fase preocupante. Os problemas se arrastam. Notícias desencontradas e polêmicas geram insegurança em todas as camadas sociais. Óbvio que os menos favorecidos deveriam ser o alvo de nossa atenção, não apenas diante da crise cuja solução ninguém imagina, mas, sobretudo, nas eleições. Nosso voto tinha que sopesar o bem maior, o da população carente. Infelizmente, pequena porcentagem do eleitorado tem esse desprendimento; a maioria vota de acordo com os próprios interesses. O empresariado tenta eleger candidatos que favoreçam a classe; o professorado, idem; o pobre, naqueles que lhe prometem mundos e fundos, se forem eleitos, quando não o “pagam” previamente. O voto-cabresto é prática comum. O empregado vota segundo a “ordem” do patrão. Caro leitor, se você trabalhou em seção eleitoral sabe do que estou falando. O espaço de que disponho aqui é pouco, para mencionar os absurdos observados nas mesas receptoras durante as eleições. Só vendo para crer. O resultado é previsível: representantes tiram vantagens de todo lado, ao invés de corresponderem aos anseios do povo. E a corrupção corre solta. Um porém: corrupção não é privilégio do Brasil; é mal que assola a maioria dos países. A diferença reside na punição desse crime abominável, prejuízo para toda a sociedade. Afinal, o dinheiro público sai dos nossos bolsos. Se há desvio de finalidade, quem perde? O povo. A meu ver, além da necessidade urgente de reforma da legislação brasileira, em vários campos, a educação é a base para mudar o país que chafurda na lama. Nossa mentalidade precisa mudar. A vida está cara? Está. Mas ninguém deixa de pintar o cabelo, fazer as unhas, queimar combustível nas estradas, curtir praia no feriadão. Imaginem uma quitanda e uma sorveteria, num dia de calor insuportável. Onde haverá mais consumidores? Sem medo de errar, respondo: fila na sorveteria. Ora, o preço de uma bola de sorvete – média de R$ 5,00 – daria para comprar um montão de bananas ou laranjas, certo? Para a saúde, o que é mais adequado: sorvete ou fruta? Portanto, a questão é esta: desde os primeiros passinhos do indivíduo, a educação precisa ser revista. Valores distorcidos levam à falsa cidadania. Ouço muito que fulano e beltrano querem mudar de país. Pois garanto que vão num voo e voltam no outro, se forem amantes de frutas , legumes e verduras deste solo gentil. Em qualquer esquina, temos o essencial para uma alimentação balanceada, desde que valorizemos o que nos faz bem. Porcariadas são supérfluos de fim de semana (antigamente, eram banquete de aniversário). Nossa fartura inexiste lá fora. Nos hotéis, bananas, se houver, são controladas. Vi isso, ao vivo e em cores, num hotel inglês: às escondidas, a garçonete ofereceu-me duas bananas. Esclareço que não lhe dei gorjeta nem antes nem depois. A corrupção, palavra da vez, começa dentro de casa.Somos todos corruptos. Os pais corrompem o filho, quando lhe dão trocadinhos porque limpou o cocô do cachorro. O mesmo, quando o presenteiam com carro, moto, bicicleta, porque entrou na faculdade, passou de ano. Ora, estudo é obrigação. “Presentear” por quê? Em eventos sociais, o conviva passa uns trocados para o garçom ser mais pródigo no serviço; nos bailes, as senhorinhas passam trocados aos free dancers contratados pelo clube, a fim de garantirem danças a mais; penetras também são corruptos, ou não? Enfim, leitor, é fácil extrair, do cotidiano, exemplos de corrupção. Bastam óculos honestos. Assim, é justo chamar de corrupção apenas o crime que acontece nos altos escalões? Estamos com um baita ponto de interrogação quanto aos rumos do amado Brasil. Façamos nossa parte. A faxina tem de começar já. Dentro da nossa casa. mineprado@gmail.com Abril/16

Obrigadão (Extra News - 11/5/16)

Obrigadão Uma postagem no FB diz que abril é o mês da gratidão. Ora, que eu saiba, devemos dar graças pelas benesses da vida, a todo instante, dia e noite. Será que isso já era e eu estou desatualizada? Pois aqui e agora tenho muito a agradecer a gentileza redobrada da bela loira que, recentemente, foi-me de grande auxílio no supermercado. Aliás, reconheci nela a professorinha de ginástica de anos atrás. Mas, com mil coisas na cabeça, não cheguei a indagar se ela se lembrava de mim e de nossas aulas. Num sábado, calorão de matar, fui ao Dia, à procura de leite em pó desnatado. Achei três latas. Peguei mais algumas coisas e logo estava na fila preferencial. Ah, na rápida andança, pedi a alguém o favor de pegar uma garrafa térmica no alto de uma prateleira. Eu até alcançaria, porém o risco de derrubá-la era grande, já que meus dedos pouco colaboram quando preciso segurar objetos maiores. Fiquei feliz por ter a humildade de pedir ajuda e, por sorte, para a pessoa certa – um cavalheiro. Logo fui para a fila preferencial. Na hora de ser atendida, esqueci os resmungos da minha coluna, a cada vez que eu mergulhava no carrinho para tirar as coisas e pô-las na esteira rolante. Então, notei a mesma moça loira (leia-se “senhora”) junto a mim no caixa. Para minha surpresa, ela passou a auxiliar-me naquela ginástica fora de hora. Num instante, minhas compras estavam registradas, pagas e amontoadas para serem embaladas. Esse supermercado não tem empacotador, um dos motivos de eu só pisar lá, quando não tenho alternativa. Por isso, a etapa seguinte: abrir sacolinhas plásticas e enfiar as compras nelas. Mais um sacrifício: briga dos meus dedos com as sacolinhas. Se estou apressada ou há alguém atrás de mim esperando que eu desocupe o espaço, esqueço a etiqueta, lambo o dedo, sem me importar com os olhares pasmos. Afinal, o cuspe e os dedos (sujos sabe Deus de quê) são meus. Pois, novamente, a moça loira estava ali, estendendo-me sacolinhas abertas. Ou seja, ela, muito ágil, já estava com as compras dela arrumadas, poderia ter ido embora, mas não. Preocupara-se comigo e ficara para me auxiliar. Quase não acreditei. Disse-lhe obrigada várias vezes. Cheguei à minha casa com o core satisfeito, mas me sentindo meio culpada. Por quê? No caixa, fizera mau juízo da moça, ao pensar que ela me ajudava, por estar impaciente com minha lerdeza para esvaziar o carrinho. Nada disso. Realmente ela havia sido solidária, sensibilizara-se com minhas limitações. Que coisa linda! Sim, linda, porque ajuda espontânea é raridade. O mundo anda tão acelerado e conectado que só se ouve falar da falta de tempo... Vai longe a época em que a rotina de qualquer mortal incluía dedicar um pouco de atenção ao outro, ainda que com pequenas gentilezas, como chamar o vizinho e passar-lhe, pelo muro, um pastel saído da frigideira, atravessar a rua e ajudar uma senhorinha com os pacotes, abrir a porta para deixar a dama passar. É, tudo passa... Por isso, eu, embora muitas vezes criticada por dizer “obrigada” pra cá e pra lá, deixo aqui um obrigadão pelas tantas gentilezas recebidas ao longo deste meu caminhar. E torço para que minha ex-professora de ginástica leia estes rabiscos, pois ela enfeitou aquele meu sábado. minesprado@gmail.com “Rabiscos de Minês”:minesprado.blogspot.com.br Maio/16