quinta-feira, 12 de novembro de 2015
As pernas são outras
As pernas são “outras”
Bons tempos em que saíamos pelas estradas, minha menina e eu. Tudo passa, mas as experiências gostosas ficam bem guardadinhas e, quando vêm à tona, muito nos divertem. Quebram a monotonia e amenizam a vida, se estamos numa fase “pesada”.
_ Mãe, por que os caminhões buzinam, quando passamos na frente deles? _ indaga a meninota inocente ainda.
Naquele dia íamos para Santos, usávamos bermudas, o calorão pedia pernocas de fora. Meu carro era pelado, sem AC ou outros opcionais. Aliás, sempre foi assim, até um ano atrás, quando fui obrigada a ter carro automático, já com frescuradas de fábrica. Uma delícia, não nego.
_ Filha, sabe, certos caminhoneiros gostam de mexer com mulher ao volante... _ engasguei, pois sabia que aquela explicação era oca demais para minha filha vivíssima.
_ Ué, mãe, que é que tem ser homem ou mulher dirigindo? Não entendi.
Criança não aceita respostas bobas. O negócio era ser clara e objetiva:
_ Sabe o que é, filha? Estamos com nossas pernas à mostra. Eles fazem gracinha também por isso.
_ Ah, mãe. Que gente chata! Sabe o que vamos fazer? Da próxima vez a gente traz uma toalha para jogar nas pernas, na hora que você for passar perto de caminhão...Que tal?
_ Boa ideia a sua. Dá uma espiada no banco de trás, veja se tem algum casaco por aí.
_ Casaco, mãe?? Com este calor?
_Querida, é só pra jogar nas pernas, quando aparecer um caminhão...
Não me recordo se havia ou não qualquer quebra-galhos naquele dia. Mas a partir dali sempre levávamos alguma coisa que escondesse nossas pernas inocentes. Agora, se estávamos de saia e o calor era muito, o pano ficava de lado. Passávamos a viagem puxando e esticando a dita-cuja.
Dia destes, uma filha postiça e eu de motorista, papeando gostosamente na estrada. Automaticamente, aproveitei para tomar banho de sol. A gente precisa de cálcio, não é? Logo há uma ultrapassagem de caminhão, uma buzinada, um piscar de faróis. Uai, por que a buzinada? Então, caímos as duas na risada, pois minha “filhota” mencionou minhas pernocas de fora.
É isso aí. Minha menina lá em cima ficou mulher, é mãe de adolescentes, os anos passaram rapidinho, minhas pernas são “outras”, mas acabo de conferir que o mundo não mudou: certos caminhoneiros, lá do alto das boleias, não podem ver motorista mulher de pernas de fora. É melhor eu providenciar logo um pano e deixá-lo bem à mão no porta-luvas, caso precise cobrir meus gambitos. Mais prático do que puxa/estica saia. Uma certeza: em nome da vitamina D e também para me livrar do calorão, não desisto de tomar um solzinho, quando estou ao volante.
Nota: A Folha de S. Paulo está com a campanha #AgoraÉQueSãoElas, em que colunistas mui cavalheiros têm cedido espaço para que mulheres escribas se manifestem. Ainda bem que tenho espaço cativo (9 anos!) no Cotidiano e, por isso, não dependo desse cavalheirismo... Obrigada, Bolinha!
Maria Inês de Araújo Prado
minesprado@gmail.com
“Rabiscos de Minês”: minesprado.blogspot.com.br
Piblicação Extra News - 11/11/15
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário