Depois de muita expectativa, a Semana Guiomar Novaes (1º a 7 de setembro) nos brindou com dois espetáculos que superaram os demais, embora todos de boa qualidade. Na abertura, a Companhia de Ópera Curta nos deliciou com O Barbeiro de Sevilha. Além da execução instrumental de indiscutível qualidade, interpretação e vozes fantásticas nos tocaram sob todas as formas, incluídos aí o riso fácil e as gargalhadas. Desopilei o fígado no teatro, o que me fez dormir gostoso naquela noite.
Mas credito à pianista Olga Kiun o destaque maior. Ela, notável, extasiou-nos com sua exímia interpretação, aliada a extremo carisma, dádiva de poucos. Como a artista bem enfatizou, sendo russa apresentaria compositores conterrâneos, os modernistas – Rachmaninoff e Prokofiev. As peças, que incluíram boa parcela de Romeu e Julieta e também as estações do ano na Rússia, foram didaticamente explicadas pela pianista, decepcionada com a falta do programa. Assim, vivenciamos cada nota trabalhada por mãos de agilidade e leveza impressionantes, cuja familiaridade com o piano é cultivada desde os seis anos de Olga.
Todo artista talentoso deve ser prestigiado. Olga merecia plateia concorrida. Não foi o que aconteceu. As frisas do teatro ficaram solitárias. Perder a oportunidade de música refinada é perder joia rara. Nossa cultura permanece capenga nos valores.
Após duas horas de puro deleite, aplausos reiterados. Tanto que Olga voltou ao palco para um brinde a mais. Mas faltou o arremate para que ela se fosse, levando não só nossas palmas, mas flores. Ela merecia esse carinho, assim como merecia o teatro lotado. Tudo isso me incomodou de tal maneira que contive meu ímpeto de lhe dirigir um agradecimento sincero, pela noite belíssima que nos proporcionou. Sem exagero, talvez até lhe beijasse as mãos divinais.
Estou ainda com esta indagação: será que projetei em Olga o que esperaria que acontecesse comigo, fosse eu uma Olga? Não sei. Mas que ela deveria sair do palco com um belo ramalhete nos braços e um cavalheiro a conduzi-la, disso tenho certeza. Além de ser de bom-tom por parte dos organizadores da Semana, seria gesto marcante no core da artista. Olga, com sua magia, combina com flores. Aquele palco teve o privilégio de ser pisado por ela, porém, nós, ouvintes privilegiados, ficamos com a vergonha da omissão de cortesia inerente a qualquer recital – flores para a pianista!
E pensar que há quem as receba, a torto e a direito, sem jamais ter regado uma...
M. Inês de Araújo Prado
minesprado@gmail.com
Set/15
Extranews de 9/9/15
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