sábado, 5 de julho de 2014

IGREJA EM TRÂNSITO

Igreja em trânsito Domingo, dia de são Pedro, a Folha publicou editorial – Igreja em trânsito - sobre as mudanças que a igreja católica pretende realizar, após pesquisa junto às dioceses, em que religiosos e católicos praticantes opinarão sobre temas polêmicos; ex.: o filho adotivo de casal homossexual faz jus ao sacramento do batismo, através do qual se torna filho amado de Deus? Tive pai “congregado mariano” e mãe “filha de Maria”, seguidores fiéis do catolicismo. Por isso, em termos de controle da natalidade, aplicavam a “tabelinha” , ou seja, faziam amor de acordo com o ciclo menstrual, a fim de não povoarem o mundo aleatoriamente. Como nem sempre a prevenção dava certo, mamãe teve sete gravidezes, cinco das quais vingaram. A prole de três homens e duas mulheres estava de bom tamanho. Impossível aumentá-la. Então, já que a tabelinha era falha, optaram por outros meios anticonceptivos, direito deles, mas contra as diretrizes de Roma. Resultado: por questão de coerência, afastaram-se da comunhão, pois viviam em pecado permanente, sob o prisma religioso... Um absurdo! Jamais engoli a ideia de que um casal amoroso, dedicado totalmente à família, fosse pecador por uma questão de foro intimo, como bem expressa o editorial da Folha de 29/6/14. Meus pais tiveram uma vida bastante sacrificada, proporcionando aos cinco filhos tudo de essencial para o bom desenvolvimento do individuo. Nossa mesa era farta, nossa saúde, zelada, nosso estudo (a maior parte em escola pública) foi de boa qualidade. Todo mundo foi batizado, fez catecismo e crisma,como manda o figurino católico. Mamãe e papai, mesmo tendo família numerosa, eram solidários e caridosos não apenas com vizinhos, amigos e estranhos, mas com a parentada toda. Então, como aceitar que se “punissem” por evitarem mais filhos? Lembrando o sermão do padre, neste dia de são Pedro: como aceitar que vivessem num martírio branco*? Não aceitava e não aceito até hoje. Após a chegada de Francisco, o papa das mudanças, vejo que estou certa, ao viver, prioritariamente, segundo minha consciência. É o que meus pais deveriam ter feito. Mas não. Dois seres absolutamente cristãos optaram pelo caminho espinhoso: a renúncia ao sacramento da comunhão, não somente enquanto mamãe era fértil, mas pelo resto da vida, já que julgavam atitude hipócrita o retorno à eucaristia. Comemoro, mesmo, a vinda de Francisco e sua visão objetiva do sofrimento imposto àquelas ovelhas desgarradas por falta de opção. Nos últimos anos, vimos avanços discretos para aliviar católicos de certos absurdos, um deles a condenação ao limbo (ausência da Luz Divina), por falta de batismo. Que culpa tem um recém-nascido de morrer sem ter sido batizado? Nenhuma. Estranho que tal aberração contra um ser indefeso, tida como “questão teológica” no documento que a eliminou em 2007, sob o papado de Bento XVI, tenha sobrevivido por tantos séculos. É um alivio a constatação de que, finalmente, o catolicismo tem olhar compassivo para divorciados, homossexuais e seus filhos adotivos, controle da natalidade, prevenção da AIDS e outros impasses vivenciados por aqueles que, compulsoriamente, têm atravessado a vida como ovelhas desgarradas. Que a Igreja de Pedro, “porteiro do reino dos céus”, remodelada sob a égide do promissor Francisco, seja sinônimo de conforto e apoio, agasalhando e norteando, amorosamente, todo cristão que a ela recorrer, em quaisquer circunstâncias. *Martírio branco: sofrimento interior, por amor a Deus. Julho/14 minesprado@gmail.com “Rabiscos de Minês”: minesprado.blogspot.com.br