O nome de Deus
Tenho observado que invocar o Pai a toda hora está na moda: ‘Deus te abençoe’, expressão que anda na boca de todo mundo, ao vivo ou via engenhocas, com a intenção de agradecimento ou despedida.
Antigamente, pedir a bênção aos avós, pais ou padrinhos era sinal de profundo respeito. Se bem que o “pedinte” às vezes cumpria um ritual imposto pela educação severa, sem convicção ou noção do ato. E, quando não queria submeter-se a tal, dava um jeitinho de furtar-se, driblando a família, “escapando de fininho”, como dizia meu velho pai, em relação a um dos meus irmãos que odiava pedir a bênção a minha avó paterna. Talvez o sangue dela, de tempero alemão, criasse alguma barreira entre ela e nós outros, sei lá.
Hoje é raríssimo alguém pedir a bênção, mas, em contrapartida, é comum almejar bênçãos Dele, como se usam ‘até logo’, ‘obrigado (a)’ e outras expressões que, no dia a dia, as pessoas empregam, de modo irrefletido, automático, com o pensamento nas compras para o feriadão, na viagem do filho, na manicure, na consulta médica e noutras questões que reinam soberanas nas cabeças sempre muito ocupadas para se concentrarem no interlocutor. É a tão conhecida falsa presença que somente a alma sensível é capaz de notar, embora disfarce, por delicadeza. Na verdade, é horrível perceber que estamos falando ao vento.
Um dos dez mandamentos que a criançada aprende no catecismo determina: “Não tomar seu Santo nome em vão.” Por isso, noutros tempos, levava-se o maior pito, quando se dizia ‘Juro por Deus’, ao mesmo tempo em que se cruzavam os dedos sobre os lábios.
Hoje, ninguém mais fala em levar pito, embora motivos para levá-lo haja de sobra. Também não se jura mais por Deus, para se fazer acreditado, mas falar mentiras no lugar de verdades é costume agarrado ao homem igual carrapato. Por sua vez os espirros, que já nascem com a gente, não merecem mais o ‘Deus te crie’ ; este caiu em desuso, foi trocado por ‘Saúde!’. Isso se alguém estiver prestando um mínimo de atenção em quem espirrou, o que nem sempre significa preocupação com a saúde alheia. Muitas vezes manifestam-se votos da boca pra fora. A cabeça pode estar longe dali, ligada à morte da bezerra...
Por essas e outras é que acho muito estranho ouvir tantos ‘Glória a Deus’ e ‘Deus te abençoe’. Desconfio de contaminação entre as crenças, pois certas demonstrações deixaram de caracterizar este ou aquele fiel, viraram hábitos de todo mundo. Então, Glória a Deus por mais estes rabiscos e Deus te abençoe por prestigiá-los.
“Rabiscos de Minês”: minesprado.blogspot.com.br
M. Inês Prado
Julho/13
Publicado no Edição Extra de 27/7/2013