Medo se adquire?
Fico emocionada, sempre que vejo pais e
filhos brincando, numa boa. Ali o amor
se manifesta em plenitude, descontraído, puro. Ali se ensina e se aprende, a
troca é linda!
Mas há que se pensar nas tantas vezes em
que brincadeiras mal dirigidas acabam se refletindo lá na frente, anos mais
tarde, em medos aparentemente inexplicáveis.
Por
que uma criança se apavora com cães se, quando pequenina, adorava alisá-los? Por que um bebê que mal dá os primeiros passos
é capaz de subir numa cadeira e dela, num beiral de janela altíssima, sem nada
temer, depois se transforma num adulto incapaz de andar de teleférico? Por que um garotinho que, se deixasse, se
jogaria na piscina funda, com roupa e
tudo, pouco tempo adiante se demonstra hidrófobo, sofrendo com a simples
tentativa de molhar os pezinhos n’água salgada?
Falo por mim. Tinha loucura para boiar,
nadar, curtir o mar ao máximo. Nos tempos de criança a família grande ia à
praia, levando as enormes boias de câmaras de pneus. Nelas, a criançada se
amontoava e, sempre com um adulto por perto, divertia-se no balanço das ondas.
Só que “espírito de porco” existe em toda família. Na minha não era diferente.
O “português”, apelido de um tio por afinidade, tinha brincadeiras bobas, além
de usar termos que marcavam a gente pro resto
da vida: polaca, bruaca, para a sobrinha gordinha – eu. Numa bela manhã, céu e
mar se confundindo no azul indescritível, ele simplesmente virou a boia em que
estávamos, eu e uns primos. Apavorei-me toda, engoli água até. Não é preciso
dizer que, desde aquele “desastre”, jamais consegui fazer muita coisa no mar, a
não ser entrar timidamente, água até a cintura apenas, prevenindo-me das
grandes ondas para equilibrar-me, e só.
Experiências negativas nos marcam e podem nos
atrapalhar vida afora. Além de ser uma santista que não
nada, também sou frustrada por não andar de bicicleta e mal cavalgar, embora o
cavalo seja meu animal do coração.
Não pedalo porque, lá nos meus seis anos,
meu dedicado pai, querendo ensinar-me,
teve a infelicidade de soltar-me antes da hora, naquele lance de ir segurando a
bicicleta por trás, até que a gente se equilibre com segurança. Resultado: fui
pro chão, numa rua de terra batida, ralando-me todinha. A aprendizagem parou
aí. Nunca mais sentei numa bike.
Cavalgo mal e mal, porque, numa das primeiras
vezes que montei um cavalo, a sela não estava bem afivelada e zás! – virou
junto comigo. Agarrada às rédeas, fui
parar na barriga do animal. Foi um sustão pra mim e pro coitado, mas não tirou minha
paixão por cavalos. Aos poucos, consegui superar o trauma, recorrendo sempre à
indagação: ”A sela está bem presa, moço?“ Tendo chance, escolho um lindão,
daqueles bem imponentes e com olhar de
mui amigos, e dou uma voltinha, com pose de dona do universo. Na última
aventura, um marchador levou-me por trilha em mata fechada, subindo e descendo
morro, eu driblando galhos de árvores para não ser degolada. Um moleque franzino,
meu “guia”, chicoteava o cavalo dele, esquecido desta falsa amazona lá
trás. A loucura valeu a viagem a Termas
de Jurema, lugar badalado que não faz meu gosto.
Retomo a questão: Medo se adquire? Dizem
que criança não tem medo de nada. Por isso, a lição que fica é que, talvez, a
gente aprenda a ter medo, não apenas pelas advertências, desde pequena, mas
pelas experiências negativas - os sustões.
M. Inês Prado
Jun. /13
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