domingo, 30 de junho de 2013
Rabiscos de Minês: ...
Rabiscos de Minês: ...: O gigante tem cócegas Meus pais, eternos apaixonados, eram discretos n...
O Gigante tem Cócegas
Meus pais, eternos apaixonados, eram
discretos nas demonstrações de carinho entre eles, quando estavam fora das
quatro paredes. Brincadeiras de um com o outro, na frente dos filhos, eram
raríssimas, mas uma está vívida como se tivesse sido ontem.
Num sábado à tarde papai fazia a sesta, luxo
a que se permitia apenas no fim de semana. Cochilava gostoso, quando mamãe
resolveu acordá-lo por algum motivo qualquer, talvez para um cafezinho com
bolinho de chuva. Só que inventou um
jeito divertido de despertá-lo: com uma escova de lustrar sapatos, passou a
alisar os pés do Dan, ora um, ora outro. Papai não se mexia, parecia desmaiado,
enquanto ela insistia. De repente, ele nos surpreende com um pulo daqueles,
assustando todo mundo. Em seguida, um
tremendo acesso de riso toma conta do quarto deles. Mamãe, muito vermelha,
perde até o fôlego. Mas o “troco” vem rapidinho: papai a pega de jeito e a joga
na cama. Em seguida, quase a mata de cócegas por todo lado. Que judiação essa
lição que papai, um homenzarrão mui cavalheiro, deu para sua Edy. Tenho certeza
de que ela aprendeu muito bem que com cócegas não se brinca. Ela e a filharada
toda.
Pois bem, nestes dias, nosso Brasil, “gigante pela própria natureza”, quieto demais
nas últimas décadas, também reagiu a tantas provocações, cutucões, lero-lero,
tapeação, corrupção, desmandos, inconsequências, ou seja, sua paciência se
esgotou.
Por isso, ergueu-se, tenteando daqui e dali,
tímido a princípio, deu alguns passos miúdos, depois mais longos, e ganhou
espaço sem limites. Para susto da plateia de camarote, silenciosa e incrédula,
ele criou coragem, ensaiou os primeiros urros, sacudiu o corpanzil, muniu-se de
“bastas” e – que ousadia! – não deitou mais. Hoje, mais forte que nunca, dá indícios de que não sairá de cena tão logo.
A “plateia de cima” reage, confabula, retroage,
corre a divulgar ideias estapafúrdias, uma delas risível demais: “corrupção é
crime doloso”! A turma de lá vive um
caos, mas parece ter entendido a mensagem do gigante, tanto que a ordem é trabalhar como nunca, em busca de soluções
urgentes. A mamata acabou. Nada de jogos
da Copa das Confederações.
O gigante, que carrega no bojo mais de 194
milhões de pensantes, estava adormecido desde o século 20. Agora, finalmente, entra
em cena com performances inusitadas para
os incautos ou confiantes demais na moleza dele. A plateia lá dos altos está
temerosa e, se bobear, manietada. Sua
proteção é precária. Ela percebe que a confabulação tem que chegar a atitudes concretas
e efetivas, que controlem o monstro insone, de olhos arregalados há muitos dias,
fazendo barulho por todo lado, e bagunçando
a mesmice.
Basta de ser o gigante “do
futebol, da mulher bonita e do carnaval”! O portento quer muito mais.
De fato, era mais que hora de o gigante acordar
e fazer frege por aí, chacoalhando aqueles que tanto o perturbam. O fortão prova
que não é brinquedo de ninguém. Sentiu cócegas, despertou, refletiu e, então,
reage com bravura, dando demonstrações claras
de que não descansará tão cedo, ainda que à custa de muitos sacrifícios e
tristezas. Se é para ter show, que seja marcante,
com tantas reprises quantas forem necessárias. O gigante revigorou-se. Quando
sossegará? - incógnita que está deixando a plateia lá de cima de cabelo em pé.
Para tapear a saia justa em que está metida, ela fala em redemocratização...
Veremos!
M. Inês Prado
Junho/13
sábado, 22 de junho de 2013
Plebiscito abrangente
Aborto, casamento gay, drogas, maioridade penal são questões que, todo dia, frequentam as páginas dos jornais e a TV. Por isso, é nosso dever nos inteirar das discussões que esses temas suscitam, refletindo e opinando, pois qualquer alteração no status quo afeta a todos nós, positiva ou negativamente. Afinal, viver em sociedade implica submeter-se à legislação vigente.
Lidar com certas faces da vida é custoso, dá dor de cabeça, gera constrangimento, exige conhecimento de causa, parcimônia, bom-senso e objetividade, esta a mais difícil, se a questão em pauta remexe nossas dores decorrentes de alguma vivência pessoal. Evitar a influência da subjetividade é fundamental para uma conclusão isenta de sentimentalismo e/ou individualismo, ou seja, que vise ao bem comum.
*Opinar se o aborto, em qualquer caso, deve ou não ser descriminalizado pode ser mais simples, se nunca nos deparamos com a terrível decisão de interromper uma vida. Há grupos insistindo que, até determinado tempo de gestação, ela inexiste. Mas não se pode ir pela cabeça dos outros; é imperioso mergulhar fundo nas nossas convicções, para obter resposta ponderada, além de coerente com nossos valores.
Se o primeiro vestígio de um botão numa planta nos alegra, por que não nos alegrar com a notícia de um embrião? Se o embrião parece estar defeituoso, é preciso lembrar que flores também não são perfeitas. O feto é anencéfalo? Ora, já que a medicina faz descobertas surpreendentes de um dia para outro, quem nos garante que aquela vida em “botão” não terá “conserto”? Ninguém. Os exemplos em que a ideia do aborto entra em cena são inúmeros, passando, é claro, pela gravidez indesejada ou precoce, as que mais ensejam o aborto clandestino, motivo de inúmeras mortes por infecção, hemorragia e outras complicações.
*Para as gerações criadas no conservadorismo, o casamento gay é aberração. Mas seria útil observar como a juventude encara a relação homoafetiva, para entender certos posicionamentos. Hoje, jovens heterossexuais que estejam em um lugar onde predomina a frequência de homossexuais encaram tudo com a maior naturalidade. Na verdade a cabeça conservadora e/ou presa a convicções religiosas projeta o que sente, tendo reações absurdas, como expulsar filho (a) homossexual de casa ou entender a opção sexual como doença a ser tratada, haja vista o projeto da comissão de Direitos Humanos, presidida pelo deputado Marco Feliciano – permitir a psicólogos oferecer tratamento para a homossexualidade, ou seja, a “cura gay”, segundo críticos da ideia (FOLHA, A8, de 19/6/2013).
*A descriminalização (que não se confunda com liberação!) das drogas é arma de dois gumes. Experiências em outros países mostram resultados divergentes, positivos ou desastrosos. O importante é pensar em termos de cultura brasileira, principalmente educação: o povo, de modo geral, está preparado para lidar com as consequências da descriminalização das drogas? O Estado está estruturado para oferecer suporte e alternativas para os viciados e suas famílias? A sociedade já superou o preconceito e pode encarar, de frente, toda a complexidade do mal que destrói famílias inteiras?
*Quanto à maioridade penal, está mais que na hora de cessar o paternalismo da sociedade e do Estado. A ladainha que envolve a idade de 16 anos para votar já deveria ter surtido efeito. O triste é que, enquanto a longevidade força o repensar de idade para a aposentadoria mais tardia, a ousadia ou a submissão dos menores, estes muitas vezes postos “a serviço” dos maiores, obriga-nos a repensar a maioridade penal, hoje 18 anos, e sua redução para 16 anos. É mesmo muito triste!
Essas questões polêmicas se arrastam, embora a urgência de soluções. Talvez um plebiscito abrangente seja o caminho mais sensato, desde que a vontade do povo seja respeitada e traduzida em leis, sem mais delongas. Basta de retórica, como tão bem retratam as manifestações públicas nos últimos dias, ao reivindicar atuação política e governamental correta e efetiva, em todos os âmbitos deste gigantesco Brasil.
M. Inês Prado Junho/13
sábado, 15 de junho de 2013
Recuerdos
Usted no me ensiño a olvidar
Há um ano eu o ouvi pela última vez. Não, não é bem assim, porque ainda o ouço, nitidamente, nos momentos que se relacionam com você ou conosco. E eles são muitos. Sabe, por um tempão, eu mantive sua voz (como eu a amava!) na “secretária”. Assim, matava minha saudade, reprisando seus recados. Só que, num desses tantos reprises, apertei o botão errado, apagando tudo. E, acredite, foi, justamente, poucos dias antes de você imitar o condor. Teria sido ato falho meu, para me poupar de futuro masoquismo?
Hoje o domingo amanheceu ensolarado, sol frio prenunciando o inverno. Fui visitar você, levei-lhe flores amarelas. Aproveitei para limpar a placa com seu nome, suas datas (qualquer hora escreverei sobre elas) e também a moldura do seu retratinho (você e seu olhar distante). Esfreguei-as com limão, como sempre tenho feito, para reavivar o dourado. Então, joguei um pouco d’água em tudo e...
_ Ai, que friiiio! Ai, ui! – pareceu-me ouvi-lo gritar, pois era assim que você reagia, quando ligava o chuveiro e a água ainda não estava bem quente.
Chorei. E agradeci por você me fazer chorar. A gente precisa chorar, para não se afogar por dentro. (Reflexão forte, ainda que piegas. Dá pra falar de amor, sem nunca ser piegas?)
Voltei para casa em paz, mas triste. Eu queria tocar aquela música do condor; você gostava tanto dela, dizia que lhe dava vontade de sair por aí, sem rumo, longe, bem longe! Não a encontrei. Toquei outras que lembram nossos encontros e desencontros: Usted no me ensiño a olvidar, em Boleros Latinos (José Collantes), e também The Apology, interpretada por Luciano Pavarotti, em The mirror has two faces (Barbra Streisand e Jeff Bridges). Chorei mais, mas falta muito para pôr em dia este meu choro.
Sabe, quando a tristeza bate, reajo, faço, crio. Vi umas bananas nanicas já meio passadas e não tive dúvida. Fiz uma bela calda, pus canela e limão para dar aquela cor avermelhada (limão tem tanta serventia!), acrescentei as bananas picadas. Logo o cheirinho inconfundível de bananada se espalhou pela casa, enquanto eu mexia tudo com a colher de pau, até que o fundo da panela aparecesse.
Mexia e revivia nossa história, nossos hábitos. Lembra aquele lance de separar para você uma vasilhinha cheia de doce de colher, seu preferido? Aliás, nossas vasilhinhas se revezavam, pois você também me trazia coisas gostosas. Agora, bocadinhos de doce para você, só em pensamento. Se bem que, esteja onde estiver, você pode até estar provando dos meus quitutes, não?
Pois é, meu rapaz, você me falava sempre do voo do condor, grande abutre dos Andes. Você, profundo conhecedor da natureza, me ensinou muitas coisas, principalmente sobre a fauna e a flora Mas, decididamente, usted no me ensiño a olvidar .
M. Inês Prado
Junho/11
Rabiscos de Minês: Zorba, o grego e o Dia dos Namorados
‘Zorba, o grego’ e o Dia dos Namorados
No feriado de Corpus Christi a TV Cultura reprisou ‘Zorba, o grego’, produção grego-americana de 1964, dirigida por Michael Cacoyannis.
A interpretação de alguns grandes da sétima arte me aqueceu corpo e alma: Anthony Quinn (1915-2001) mexicano inimitável, Alan Bates (1934-2003), lindo palmo de rosto, Irene Papas (1926), grega de beleza forte, e Lila Kédrova (1918-2000), russa expressiva, ganhadora do Oscar de melhor atriz coadjuvante.
A canção Sirtaki, composta por Mikis Theodorakis, ficou famosa, pelo desempenho de Zorba, ao dançá-la divinamente, acompanhado pelo tímido Basil, escritor em crise de criatividade, que vai à ilha de Creta para reabrir a mina de linhito, herança do pai.
Zorba, o grego, é um deleite, do começo ao fim, um cardápio variado para nossas emoções às vezes meio embotadas. Há momentos tragicômicos, como o desabamento do pretenso teleférico construído por Zorba, para transportar madeira. O fiasco da engenhoca leva todo o dinheiro do escritor Basil.
Dois affaires servem de elo para todo o desenrolar da trama: o affaire entre Zorba e uma ex-cortesã francesa, dona da pensão “Hotel Ritz”, e o outro, entre Basil e uma viúva grega cobiçada por todos os homens de Creta.
Zorba não leva o relacionamento muito a serio, parece praticar caridade, nas suas demonstrações de afeto para com a velhota, sua senhoria. Só que esta se alimenta dos mais altos sonhos, tal mocinha à espera do príncipe: enquanto Zorba viaja e se diverte com uma jovem, a pobre sonha com um presente que pede para o amado, metros de cetim branco para o vestido de noiva...
Por sua vez, Basil, sensível, poético, não resiste à beleza da viúva grega e os dois acabam nos braços um do outro, para revolta dos locais. Resultado: a “traidora” é condenada ao apedrejamento, do que Zorba tenta salvá-la, mas falha.
‘Zorba, o grego’, trazido para os dias de hoje, mostra que o século virou, mas as coisas do amor não mudaram muito, não do lado feminino. As mulheres do século 21 ainda alimentam devaneios com vestido de noiva, com palmo de rosto másculo, com flores e laços. Continuam românticas inveteradas, embora todas as lambadas da vida, frutos talvez de escolhas cegas e/ou afoitas.
Semana passada, assisti à reportagem feita numa cafeicultura, na vizinha cidade de São Sebastião da Grama. O tema? Desfile de mulheres que trabalham no cultivo do precioso grão e que estão experimentando o gosto da passarela pela primeira vez, com direito a cabeleireiro, manicure, maquiagem, vestido de festa e prêmios. Transformadas em princesas por um dia, deram entrevistas e falaram de sonhos. Uma delas, morena de olhar expressivo, declarou, com muita simplicidade:
_ O que mais quero é ganhar um buquê de rosas. Nunca recebi nenhuma flor...
Vou torcer para que o sonho dela se realize. Ao menos uma vez na vida, que ela sinta o coração aos pulos, abraçada a um belo ramalhete, tal qual debutante de 15 anos.
Afinal, até quem ganhou buquês vida afora, não deixa de sonhar com flores e laços. Por mim, confesso que uma flor do campo, amarelinha, colhida por um Zorba, durante um passeio de mãos dadas, far-me-ia mais feliz que dúzias de príncipe negro.
M. Inês Prado
Jun./13
domingo, 2 de junho de 2013
Medo se adquire?
Fico emocionada, sempre que vejo pais e
filhos brincando, numa boa. Ali o amor
se manifesta em plenitude, descontraído, puro. Ali se ensina e se aprende, a
troca é linda!
Mas há que se pensar nas tantas vezes em
que brincadeiras mal dirigidas acabam se refletindo lá na frente, anos mais
tarde, em medos aparentemente inexplicáveis.
Por
que uma criança se apavora com cães se, quando pequenina, adorava alisá-los? Por que um bebê que mal dá os primeiros passos
é capaz de subir numa cadeira e dela, num beiral de janela altíssima, sem nada
temer, depois se transforma num adulto incapaz de andar de teleférico? Por que um garotinho que, se deixasse, se
jogaria na piscina funda, com roupa e
tudo, pouco tempo adiante se demonstra hidrófobo, sofrendo com a simples
tentativa de molhar os pezinhos n’água salgada?
Falo por mim. Tinha loucura para boiar,
nadar, curtir o mar ao máximo. Nos tempos de criança a família grande ia à
praia, levando as enormes boias de câmaras de pneus. Nelas, a criançada se
amontoava e, sempre com um adulto por perto, divertia-se no balanço das ondas.
Só que “espírito de porco” existe em toda família. Na minha não era diferente.
O “português”, apelido de um tio por afinidade, tinha brincadeiras bobas, além
de usar termos que marcavam a gente pro resto
da vida: polaca, bruaca, para a sobrinha gordinha – eu. Numa bela manhã, céu e
mar se confundindo no azul indescritível, ele simplesmente virou a boia em que
estávamos, eu e uns primos. Apavorei-me toda, engoli água até. Não é preciso
dizer que, desde aquele “desastre”, jamais consegui fazer muita coisa no mar, a
não ser entrar timidamente, água até a cintura apenas, prevenindo-me das
grandes ondas para equilibrar-me, e só.
Experiências negativas nos marcam e podem nos
atrapalhar vida afora. Além de ser uma santista que não
nada, também sou frustrada por não andar de bicicleta e mal cavalgar, embora o
cavalo seja meu animal do coração.
Não pedalo porque, lá nos meus seis anos,
meu dedicado pai, querendo ensinar-me,
teve a infelicidade de soltar-me antes da hora, naquele lance de ir segurando a
bicicleta por trás, até que a gente se equilibre com segurança. Resultado: fui
pro chão, numa rua de terra batida, ralando-me todinha. A aprendizagem parou
aí. Nunca mais sentei numa bike.
Cavalgo mal e mal, porque, numa das primeiras
vezes que montei um cavalo, a sela não estava bem afivelada e zás! – virou
junto comigo. Agarrada às rédeas, fui
parar na barriga do animal. Foi um sustão pra mim e pro coitado, mas não tirou minha
paixão por cavalos. Aos poucos, consegui superar o trauma, recorrendo sempre à
indagação: ”A sela está bem presa, moço?“ Tendo chance, escolho um lindão,
daqueles bem imponentes e com olhar de
mui amigos, e dou uma voltinha, com pose de dona do universo. Na última
aventura, um marchador levou-me por trilha em mata fechada, subindo e descendo
morro, eu driblando galhos de árvores para não ser degolada. Um moleque franzino,
meu “guia”, chicoteava o cavalo dele, esquecido desta falsa amazona lá
trás. A loucura valeu a viagem a Termas
de Jurema, lugar badalado que não faz meu gosto.
Retomo a questão: Medo se adquire? Dizem
que criança não tem medo de nada. Por isso, a lição que fica é que, talvez, a
gente aprenda a ter medo, não apenas pelas advertências, desde pequena, mas
pelas experiências negativas - os sustões.
M. Inês Prado
Jun. /13
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