Ladrões do tempo
O autoatendimento, parte da rotina em muitos países, invade, aos poucos, o mundo do consumidor brasileiro.
Nos supermercados já é comum, após o pagamento, termos que ajeitar nossas compras nos saquinhos e carregá-las pelas ruas ou, no caso dos mais favorecidos, pô-las no carrinho desajeitado e empurrá-lo até nosso possante. Se faz sol ou chuva, se estamos capengas ou não, isso não interessa a ninguém. A atual política do comércio é indiferente às questões humanas, já que seu objetivo único é o maior lucro possível, graças a várias táticas, sendo uma delas o enxugamento do quadro de funcionários.
O público enfrenta a redução de atendentes faz tempo, o que começou, escancaradamente, nos estabelecimentos bancários, quando caixas eletrônicos e internet banking substituíram o atendimento pessoal. Azar daquele que tem dificuldade em lidar com botões, teclas, senhas etc. Se houver algum funcionário SOS para salvar o analfabeto funcional de maior constrangimento, ótimo. Quando nenhuma ajuda é proporcionada pelo banco, o jeito é sair de fininho e voltar com um anjo que contorne a enrascada em que se vê quem não consegue lidar com máquinas e botões desafiadores, quando não malucos, vomitando mensagens, como: “a operação não pode ser concluída”, “erro na contagem de cédulas” etc.
Semana passada a FOLHA (B2, 10-12-12) noticiou que o autoatendimento integral, nos supermercados, chega ao Paraná, graças ao investimento de uma rede de grande porte – Muffato. Claro que a novidade, denominada self checkout, no valor de 30 a 50 mil reais por terminal, logo se espalhará Brasil afora. É a lei da concorrência.
Na Inglaterra e nos Estados Unidos pude conferir essa realidade. Se o cliente está com pressa ou é fã da tecnologia, opta pela self checkout, onde passa todas as compras pelo scanner, que lê os códigos de barra (e também “barra” bebida alcoólica, após as 22h, na Inglaterra!) e registra os valores. Concluída a operação, o pagamento é feito através da inserção do cartão débito/crédito no lugarzinho adequado e pronto! Emitido o comprovante, o cidadão ou cidadã, às vezes com ar de sapiência vitoriosa, apossa-se do carrinho repleto de tudo e se manda. Depois, sem nenhuma mãozinha amiga, terá de esvaziá-lo no carro e retorná-lo ao local indicado nas tantas placas aqui e acolá.
Mas, com a aceleração da tecnologia, logo o consumidor deverá ser poupado desse último “trabalho”. Provavelmente, robôs colocarão as compras nos carrinhos e as transferirão para nossos possantes, enquanto nós, meros acompanhantes, aproveitaremos para fuçar o celular, acessar e-mails, retomar algum joguinho de ‘paciência’ iniciado durante o trajeto num carro todo eletrônico etc.
E ‘assim caminha a humanidade’ (lindo filme!). Num futuro muito próximo, estaremos tão absurdamente (confortavelmente?) envolvidos com as máquinas que não nos restará tempo para estar, fisicamente, com o outro, o humano ao nosso lado.
Fico imaginando um Natal sem internet, de tal modo que a confraternização reavivasse os velhos tempos, quando os Bons Votos acompanhavam um belo abraço, sem pressa nem toques de celular. E em que as crianças, após as rezas e o Noel, com seu saco de surpresas, disputavam os chocolates de um pinheiro cheiroso e fartamente iluminado.
Àqueles que ainda encontram tempo para ler meus rabiscos, FELIZ NATAL.
M. Inês Prado
Dez./12
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